Debates
A "greve" dos caminhoneiros e a lógica do quanto pior melhor
Da Redação | 30 de maio de 2018 - 01:31
Por Rodrigo Augusto Prando
No campo semântico encontra-se, em esforço, "greve dos
caminhoneiros", "paralisação dos caminhoneiros", "crise de
desabastecimento", "lockout do setor empresarial".
Independente da semântica, a situação que a sociedade brasileira vivencia é
assaz grave. Estruturalmente, somos "rododependentes", dependemos do
modal rodoviário em detrimento das ferrovias e hidrovias. Em termos de
conjuntura política, cabe, sem titubear, questionar a quem interessa a lógica
do quanto pior melhor. A quem interessa?
Sabidamente, o Governo Temer é fraco, impopular, com uma equipe aquém do se
esperaria tanto no campo da comunicação institucional ou da prática política.
As denúncias da Procuradoria Geral da República fizeram com que Temer gastasse
seu pouco capital político para não ser investigado e, possivelmente, afastado
da Presidência. Com isso, sua visão, obnubilada, não teve a visada necessária a
compreensão da gravidade da crise que se avizinhava tendo como ponto fulcral os
caminhoneiros. As condições laborais e nas estradas brasileiras são, sem
dúvida, cruéis aos caminhoneiros. Mas, nem de longe são, de todos os
trabalhadores, os mais precários ou explorados. Com isso, pode-se,
peremptoriamente, afirmar que uma paralisação ou uma greve seria justa e legal,
mas o que vemos já passou da legitimidade e dos interesses de trabalhadores.
Não bastasse as claras digitais da classe patronal num lockout, veio
à tona que, no momento, os interesses estão, entre outros, na demissão de Pedro
Parente da Petrobrás (com anúncio de greve dos petroleiros, cujo sindicado tem
ligações conhecidas com partido político), a mudança dos critérios do preço dos
combustíveis e, pasmem, a retomada do "Fora Temer". Assim, novamente,
a quem interessa com pouco mais de quatro meses para as eleições, retirar Temer
do poder? Temer é fraco, ruim, isso é fato público; mas, nem de longe, pode ser
comparado, por exemplo, ao Governo Dilma, muito, muitíssimo pior. Sem pudores
em ter se transformado numa "fábrica de narrativas" e não mais num
partido político, petistas, agora, chegam a afirmar que a gasolina e diesel
estão mais caros com Temer do que eram com Dilma. Querem apagar, como regimes
autoritários, a recente realidade de incapacidade de gestão, populismo e
corrupção que arrebentou a Petrobrás na era "lulopetista". Há muito,
alhures, já se afirmou que o brasileiro não gosta de capitalismo, gosta de um
Estado hipertrofiado e benevolente com uns à custa de todos.
Não nos enganemos, pois! Derrubar Temer e apostar na lógica do quanto pior
melhor não está no horizonte dos democratas, dos liberais, da esquerda
democrática, dos sociais-democratas. Não. O quanto pior melhor está mais
próximo das posturas autocráticas, à esquerda e à direita. E, nesse caso,
pode-se imaginar uma ferradura em que os extremos estão nas pontas mais próximos
do que distantes, numa visão anacrônica, num Estado intervencionista, no
discurso da ordem, da força, da hierarquia. A quem, caro leitor, interessa essa
situação: Petrobrás derretendo na bolsa de valores, os agentes do mercado
elevando os riscos políticos no Brasil, a melhoria da economia que era lenta já
está perdida neste ano, alimentos estragados, milhões animais mortos, preços de
produtos exorbitantes? Os caminhoneiros autônomos, certamente, tinham demandas,
mas foram instrumentalizados por interesses bem distantes dos seus. Há um
desencontro da história, da realidade, com a consciências social de indivíduos
e grupos. Perdemos, todos, sempre, pois o custo chegará.
Rodrigo Augusto Prandoé Cientista Político e professor da Universidade
Presbiteriana Mackenzie. É Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais, Mestre e
Doutor em Sociologia, pela Unesp/FCLAr.