Debates
Os golpes no Brasil e novamente o ataque ao ensino de Filosofia
Administrador | 26 de setembro de 2016 - 02:02
Por Regis Clemente da Costa
Voltaire, filósofo iluminista Francês, no ano de 1857, em
recomendação ao Rei da Prússia, afirmava que a canalha (as massas) não era
digna de ser esclarecida. Segundo ele, “é essencial que o povo seja guiado e
não seja instruído”.
O pensamento de Voltaire, nos ajuda a compreender o objetivo
das mudanças no Ensino Médio Brasileiro, decretadas pelo presidente (sem
votos), Michel Temer, de maneira arbitrária, por meio da Medida Provisória nº.
746/2016, publicado no Diário Oficial da União no dia 22 de setembro. Ao fazer a
mudança por meio de MP, Temer, exclui toda possibilidade de discussão, debate e
proposições de entidades ligadas à educação, pesquisadores, estudantes e
professores, enfim, sujeitos envolvidos concretamente com a educação
brasileira. Porém, chamou, entre outros, os maiores bancos privados
brasileiros, e até mesmo o ex-ator pornô, Alexandre Frota, com a finalidade de
ouvir as suas propostas para a educação. Pasmem! O próprio Ministro da
Educação, Mendonça Filho não tem experiência na área da educação.
A
mudança arbitrária, via Medida Provisória, torna opcional as disciplinas de
filosofia e sociologia, devido a alteração do artigo 36 da LDB e restringe as
disciplinas de Arte e Educação Física à Educação Infantil e ao Ensino
Fundamental. Trata-se de um retrocesso de décadas na educação brasileira e um
ataque gravíssimo à formação dos estudantes.
Em
relação ao ensino de filosofia, ao longo da história do Brasil, por um bom período,
esteve restrito à formação dos filhos das elites. Na década de 1960, após
alguns anos presente no currículo das escolas públicas, ele é novamente e,
dessa vez, passa a ser proibido, pois era entendido como uma ameaça à ditadura
militar que tolhia a formação do pensamento crítico dos estudantes.
Consequentemente, a filosofia não deveria ser ensinada para não conflitar com a
forma de governo e de comando da ditadura. A partir de 1982, a filosofia foi
liberada para compor o currículo como disciplina opcional, no entanto, ela foi incluída em pouquíssimos estados. Com
a LDB 9394/96, o debate foi retomado, porém, a filosofia foi citada apenas como
“conhecimento necessário ao exercício da cidadania”. Em 2001, após aprovação na
Câmara e Senado, seu retorno foi vetado por FHC.
A provação do retorno do ensino de filosofia, como
disciplina obrigatória no Ensino Médio, aconteceu em 2008, com a Lei nº 11.684/2008,
que alterou o artigo 36 da LDB 9394/96, sendo precedido de amplo debate entre
educadores, estudantes e movimentos sociais. Com a MP de Temer, esse artigo,
foi alterado, retirando a obrigatoriedade dessas disciplinas.
Em um novo golpe, dessa vez de marketing, após inúmeras
reações contrárias às mudanças, integrantes do governo Temer informaram que o
texto divulgado no dia 22/09, estava errado, porém, ao nos depararmos com o
texto publicado em edição extra do Diário Oficial, no dia 23/09, constamos que
não houve nada de errado. Ambos os textos são exatamente iguais.
O conteúdo da Medida Provisória 746/2016, de Temer,
causa-nos preocupação pois, há um direcionamento claro para a precarização da
formação dos estudantes, focando apenas na obrigatoriedade de conhecimentos matemáticos,
leitura e escrita, com o agravante de que, para se exercer a docência, o
professor não necessita de formação específica, necessitando apenas “notório
saber”. Esse fato, além de representar prejuízo para a construção do
conhecimento é um ataque frontal a todos os professores formados em áreas
específicas, nos diversos cursos de licenciatura no Brasil, em número
suficiente para atender às demandas da educação.
Temer e seu governo ilegítimo, supera os governos militares,
pois, não se restringiu apenas à retirada de filosofia e sociologia, atacou
também as disciplinas de arte e de educação física.
A cada dia, as ações arbitrárias de Michel Temer, vão
ficando mais explícitas e nos levando de volta à década de 1960. Lá, os
militares retiraram filosofia e sociologia, para o suposto "bem" da
nação. Em 2016, Temer retira filosofia, Sociologia, Arte e Educação Física,
pois, diz querer "o melhor" para os estudantes, com o argumento de melhorar
o IDEB (que só avalia matemática e língua portuguesa e é uma exigência do Banco
Mundial).
Desde 2008, quando o ensino de filosofia e sociologia foram
garantidos no currículo, os ataques são contínuos. Inicialmente, os ataques se
concentraram na mídia conservadora. No Paraná, no ano de 2012, o governador
Beto Richa tentou golpear filosofia e sociologia, diminuindo a carga horária.
Porém, não conseguiu, devido à luta de professores e estudantes.
Há várias características em comum, em ambos os golpes, dentre
elas, o fato de que pensar se torna um perigo ao poder dominante e, para
atender as exigências do mercado, há que se precarizar a formação dos trabalhadores
e dos filhos da classe trabalhadora.
Na ditadura militar, as mudanças e reformas na educação
brasileira foram precedidas de organização, de resistência e de luta pelo fim
da ditadura e pela transformação da sociedade. Diante da reforma imposta por
Temer, e dos retrocessos que ela trará, a saída continua sendo a organização e
a luta em defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, para além do
mercado, a fim de que nossos adolescentes e jovens sejam atuantes na sociedade,
com consciência e liberdade, não se permitindo serem guiados.
A continuidade da defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, certamente, não será uma tarefa fácil, porém, ela é necessária e urgente. Como afirmava Marx, “os filósofos interpretaram o mundo de diferentes maneiras. O que importa, no entanto é transformá-lo”!
Regis Clemente da Costa é Professor de filosofia da rede Estadual de Ensino e Professor Colaborador do Departamento de educação a UEPG